Um blogue de notícias, publicado por Miguel Marujo, jornalista com a carteira profissional nº 5950. O ponto de partida do repórter é Lisboa, mais como espaço físico onde se situa o jornalista, do que como único motivo de reportagem. Aqui não descobrirá a história ao minuto, mas uma tentativa de manter um olhar atento e, eventualmente, diferente sobre a Cidade. Envie-nos o seu alerta, a sua sugestão ou o seu comentário para mmarujo@gmail.com

31.1.07

CSI, de Miami para Lisboa

A equipa de agentes CSI, liderada pelo tenente Horatio Caine, pode vir a perseguir bandidos e a resolver crimes em Lisboa, num episódio da quinta temporada da série de televisão "CSI Miami", actualmente em exibição na SIC e no canal de cabo AXN.

O LxRepórter apurou que a equipa de produção está a estudar a possibilidade de filmar, durante o mês de Julho deste ano, em Lisboa ou Barcelona. A cidade catalã é a rival da capital portuguesa para acolher as filmagens desta série da CBS, produzida por Jerry Bruckheimer, responsável por diversos êxitos da televisão americana e filmes de Hollywood, como "Piratas das Caraíbas".

De acordo com as informações recolhidas, a produção fez uma consulta provisória de alojamento, para conhecer as disponibilidades hoteleiras da cidade, para a instalação da equipa da série, no mês de Julho. Contactado pelo LxRepórter, o gabinete de comunicação da SIC disse ainda não dispor de qualquer informação que confirme esta hipótese.

A série CSI é já um "franchising" de sucesso da televisão americana dos últimos anos. Para além da equipa de Miami, há outras duas séries, a original que decorre em Las Vegas, e a que estreou por último e tem por cenário Nova Iorque. O primeiro episódio desta nova temporada também já teve um cheirinho em português, com as filmagens a decorrerem no Rio de Janeiro, no Brasil.

[Na foto: a equipa liderada por Caine, o actor David Caruso, da quarta temporada.]

30.1.07

Cinco minutos às escuras

Quinta-feira, às 18h55 (hora de Lisbia), apague a luz. Por cinco minutos, não mais. A proposta é de uma organização para "mostrar" aos candidatos presidenciais franceses a necessidade de discutir as alterações climáticas, no mesmo dia em que será divulgado novo relatório sobre essas alterações, mas o apelo é dirigido aos cidadãos de todo o mundo.

A Aliança para o Planeta quer «cinco minutos de descanso para o planeta», para reduzir naqueles instantes a electricidade, mas também chamar a atenção de todos para o desperdício de energia «e da urgência de passar à acção».

«Cinco minutos de descanso para o planeta: não demora muito tempo, não custa nada e vai mostrar aos candidatos às [eleições] presidenciais [que decorrem em Abril, em França] que as alterações climáticas devem pesar no debate político», afirma a federação que agrupa várias associações ambientais, no seu site oficial. O texto completo do apelo pode ser lido no original em francês, aqui.

[imagem da campanha da Aliança para o Planeta]

29.1.07

Médicos debatem começo da vida humana

Dois dias intensos de discussões procuram dar “o contributo dos médicos” para o debate que atravessa por estes dias a sociedade portuguesa, com a realização do referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez. A 2 e 3 de Fevereiro, a Ordem dos Médicos realiza um seminário sobre “Quando começa a vida humana? – O contributo dos médicos”.

A lista de intervenientes é extensa e reflecte posições a favor ou contra a despenalização do aborto, mas o propósito da Ordem dos Médicos é a organização de um longo debate sob aquele tema único – o de quando se inicia a vida humana. Quatro sessões de conferências, com 14 intervenções, uma sessão de encerramento pelo bastonário da Ordem, Pedro Nunes, cuja intervenção será comentada também por dois clínicos, compõem o programa destes dois de seminário.

Entre os palestrantes é possível encontrar Maria do Céu Machado, alta comissária para a Saúde, Michel Detilleux, consultor da Comissão Europeia, Gonzalo Herranz, presidente do Comité de Ética e Deontologia Médica da Universidade de Navarra, Eva Nilsson Bägenholm, presidente do Comité de Ética da Associação Médica Mundial, Daniel Serrão, membro da Academia Pontifícia para a Vida, da Santa Sé e Miguel Oliveira da Silva, professor de Ética Médica da Faculdade de Medicina de Lisboa, entre outros.

A sessão de abertura terá lugar no auditório da Ordem dos Médicos, em Lisboa, no dia 2, sexta-feira, pelas 9 horas, e o encerramento dos debates acontece às 16 horas do dia 3, sábado.

28.1.07

Reportagens do baú*: Sair da sala para o quarto, saltar de uma freguesia para outra, pagar a dobrar

[publicado no PortugalDiário a 12 de Dezembro de 2002]

Uma casa nova dividida por duas freguesias paga registo predial para essas duas freguesias. Por inteiro



Ir da sala ao quarto custa caro a Ana Ferreira. Tudo porque a casa desta jovem de Lisboa fica em duas freguesias. Quando se movimenta dentro da sua nova casa salta de São Sebastião da Pedreira para Benfica - e, por causa disso, é obrigada a pagar dois registos prediais da sua habitação.

A situação foi confirmada ao PortugalDiário por uma das conservatórias de registo predial. Todos os proprietários do lote C5 do empreendimento da EPUL Jovem, à Azinhaga das Galhardas, encravado entre o Eixo Norte-Sul e o Estádio Universitário, têm de pagar duas vezes porque o seu prédio fica em duas freguesias.

Desde o decreto-lei nº 273 de 2001 que a tabela de emolumentos não prevê um prédio "partido" entre freguesias, como no caso do lote C5. Antes da lei, que alterou os códigos do Registo Civil, Registo Predial, Registo Comercial e do Notariado, os emolumentos previam estes casos. Agora o proprietário é obrigado a pagar por inteiro para duas freguesias.

O Ministério da Justiça diz que esta situação - que resultou de uma «alteração substancial» ainda no anterior Governo - «tem uma explicação bastante razoável», nas palavras do assessor de imprensa da ministra, Henrique Burnay. Ao PortugalDiário disse que este decreto-lei altera o princípio subjacente ao pagamento do registo: até aí presidia o princípio "ad valorem"», ou seja, pagava-se uma percentagem pelo valor do bem, que se traduzia «às vezes, em valores excessivos». Agora, o valor pago reflecte o custo dos actos administrativos, neste caso de duas conservatórias.

«Enquanto não for feita a informatização total dos serviços» não será possível fazer de outro modo, reconhece Burnay. Mas, no futuro, esta tabela poderá ser alterada. Basta ter um computador em cada conservatória para dar "baixa" na outra. «Sem informatização é um bocadinho mais difícil», diz o assessor da tutela.

Os funcionários das conservatórias dizem ser «ridícula» a situação e queixam-se do trabalho «a dobrar» que têm. Mas, na linha do que pensou a tutela, as «importâncias são menores». Mas a dobrar, no caso de Ana Ferreira, que - neste caso - bem dispensava o desconto.


[O
LxRepórter recupera ao fim-de-semana artigos antigos.]

26.1.07

Fim de tarde de copo na mão

É uma proposta quente para «noites de inverno frio»: uma prova de um vinho, esta sexta-feira, das 19h às 21h30, com o produtor da Quinta da Fata, Eurico Amaral. À Praça da Alegria (Rua da Mãe d'Água, 9), Os Goliardos é um estabelecimento que promete «vinhos, copos, etc.» e hoje, a partir do fim da tarde, apresenta o vinho tinto reserva 2004 e o branco 2005 daquela Quinta.

De acordo com os responsáveis dos Goliardos, Eurico Amaral teve «um muito feliz começo», depois de ter iniciado no ano passado a venda da sua produção.

A acompanhar a prova será mostrada uma reportagem fotográfica da vindima na Quinta da Fata.

O vinho tinto da Quinta da Fata já foi premiado com a medalha de Prata no concurso Vinhos do Dão no Produtor em 2003, e as medalhas de ouro no mesmo concurso em 2004 e 2005.

[foto Quinta da Fata]

24.1.07

Petição contra TLEBS é entregue quinta-feira

A petição que pede a suspensão da Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário (TLEBS) vai ser entregue amanhã, a partir das 11 horas, a diferentes entidades. Este texto, que continuará disponível na internet para assinatura, já soma, de acordo com um comunicado de imprensa divulgado ao início desta quarta-feira à tarde, 7904 assinaturas, prevendo-se que ultrapasse as oito mil até às primeiras horas de amanhã.

O Presidente da República, o presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro e a ministra da Educação são os destinatários destas assinaturas.

Por iniciativa de um conjunto de pais, o documento pede «a suspensão imediata da experiência pedagógica TLEBS - Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário», desde que ficou disponível on-line a 14 de Dezembro.

De acordo com os signatários, «a TLEBS é um conteúdo experimental, introduzido de modo obrigatório e generalizado no Ensino Básico e Secundário, que carece de validação cientifica e pedagógica, que encerra erros científicos graves e usa os alunos como cobaias de validação».

"Filhos de Abraão" explicam a sua fé em conferências em Lisboa



“As Religiões dos Filhos de Abraão” é o tema de um ciclo de conferências promovido pela Culturgest, em Lisboa, nas próximas segundas-feiras. O judaísmo, o islamismo, as correntes protestante, ortodoxa e católica do cristianismo, serão objecto de leituras diferentes que permitirão aos “crentes ou não” saber mais “da religião dos outros”, como se propõe na apresentação das conferências.

Outros motivos apresentados têm a ver com os dias de hoje. “Desconhecer aquilo que é um elemento fundamental da vida das pessoas, é não as compreender, é permitir que se instale em nós o preconceito e a intolerância”, afirma-se. Como aliás se questiona: “Não é verdade que, por desconhecermos a fé do outro, naquilo que ela tem de explicável, nos parece que a vida dele assenta em práticas e crenças injustificáveis no mundo actual?”

Estas cinco conferências, animadas por cinco crentes das três religiões monoteístas, ocorrem em paralelo ao ciclo de música que se denomina “Os Filhos de Abraão”. Assim, Samuel Levy, Silas Oliveira, AbdoolKarim Vadil, Ivan Moody e José Tolentino Mendonça vão “explicar a sua fé”, “por palavras que todos entendam, em que acreditam, porque acreditam e como acreditam”.

O antigo presidente da Comunidade Israelita de Lisboa, Samuel Levy, falará sobre “Judeus e Judaísmo”, enquanto que o presbiteriano Silas de Oliveira abordará a “Reforma Protestante: uma história do passado ou uma opção actual?”. O professor universitário e coordenador dos Simpósios do Instituto Muçulmano de Londres, AbdoolKarim Vadil, centrará a sua intervenção em “Testemunhar Deus com os Seis Sentidos: Islão e muçulmanos para além dos textos e dos exotismos”. Depois de uma pausa a 19 de Fevereiro, véspera de Carnaval, o ciclo prossegue com “Caminhos da Ortodoxia”, por Ivan Moody, actual presidente da Sociedade Internacional de Música Ortodoxa, e, a fechar, “O catolicismo como radical elogio da Beleza”, por José Tolentino Mendonça, padre e poeta.

O ciclo decorrerá às segundas (a 29 de Janeiro, 5, 12 e 26 de Fevereiro e 5 de Março), sempre às 18h30, na Sala 2 da Culturgest, com entrada gratuita (é necessário apenas o levantamento de uma senha de acesso 30 minutos antes do início da sessão, no limite dos lugares disponíveis).

Mais informação sobre o ciclo de conferências no site da Culturgest.

[fonte da imagem: Culturgest]

22.1.07

O novo mapa das velocidades em Lisboa

Já estão em funcionamento os 21 radares de controlo de velocidade na cidade de Lisboa, que a partir de Março serão a doer para os automobilistas que forem apanhados em excesso de velocidade. Os limites máximos variam entre os 50 e os 80 km/h.

As multas variam consoante as velocidades a que for "fotografado" pelos radares. Se o limite excedido for até 20 km/h a multa varia entre os 60 e 300 euros. Se exceder o limite em mais de 20 até 40 km/h, a sanção pode implicar ficar sem carta por um período de um mês a um ano e o pagamento de 120 a 600 euros. Dos 40 aos 60 km/h de velocidade a mais, o condutor também pode ficar sem carta durante um mês ou um ano e paga de 300 a 1500 euros. Se o condutor for "fotografado" a mais de 60 km/h, pode ficar sem carta por um período de dois meses a dois anos e pagará uma coima de 500 a 2500 euros.

O mapa destes radares em Lisboa é o seguinte:
1. Avenida de Brasília: perto da doca de Belém (velocidade máxima: 50);
2. e 3. Avenida de Ceuta: um radar em cada sentido junto ao antigo cruzamento para o Casal Ventoso (velocidade máxima: 50);
4. Avenida das Descobertas: junto às bombas da Galp (velocidade máxima: 50);
5. Avenida Gago Coutinho: um radar junto ao cruzamento de Alvalade/Bela Vista (velocidade máxima: 50);
6. Avenida da Índia: junto ao Centro Cultural de Belém (velocidade máxima: 50);
7 e 8. Avenida Infante D. Henrique: um radar em cada sentido perto da fábrica Nacional (velocidade máxima: 50);
9. Avenida Marechal Gomes da Costa: na saída leste do túnel junto à RTP (velocidade máxima: 50);
10 e 11. Prolongamento da Avenida dos EUA: dois radares junto ao viaduto sobre o Feira Nova (velocidade máxima: 80);
12. e 13. Radial de Benfica: um radar em cada sentido entre a rotunda da Serafina e os Pupilos do Exército (velocidade máxima: 80);
14. Segunda Circular/Benfica: junto à saída para a Radial de Benfica (velocidade máxima: 80);
15. Segunda Circular/Calvanas: na zona das bombas da Repsol (velocidade máxima: 80);
16. Segunda Circular/Prior Velho: à entrada de Lisboa, a seguir às bombas da Galp (velocidade máxima: 80);
17. e 18. Túnel da Avenida João XXI: um radar em cada extremidade (velocidade máxima: 50);
19. e 20. Túnel do Campo Grande: um radar em cada saída (velocidade máxima: 50);
21. Túnel do Marquês de Pombal: quando o túnel abrir terá também um radar na zona do cruzamento com a Rua Artilharia Um (velocidade máxima: 50).

[imagem: Sapo]

21.1.07

Reportagens do baú*: Perigo no túnel

[publicada originalmente a 4 de Abril de 2002 no PortugalDiário]

REPORTAGEM: O túnel do Rossio não tinha fechado nem era preocupação imediata da Refer, que prometia obras para esse ano, que foram adiadas com os resultados que se conhecem. O perigo podia espreitar para os milhares de passageiros que diariamente utilizavam a linha de Sintra, alertavam bombeiros


São 2,6 quilómetros sem segurança aparente: a olho nu não se vê qualquer extintor, nem bocas de incêndio. Pequenos nichos quebram a monotonia das paredes escuras, fracamente iluminadas por lâmpadas fluorescentes. É um longo túnel que atravessa as entranhas de Lisboa, da estação do Rossio à estação de Campolide. O perigo pode espreitar para os milhares de passageiros que diariamente utilizam a linha de Sintra.

Os bombeiros desconfiam das condições de segurança, em caso de incêndio ou de acidente. A Refer - Rede Nacional Ferroviária, entidade que gere as infra-estruturas ferroviárias do país, garante que há um plano de de segurança, que congrega aquela empresa pública, os bombeiros e a Protecção Civil. Mas, como disse fonte do gabinete de comunicação, o túnel vai sofrer uma intervenção «eventualmente no decorrer deste ano, também para reforçar a sua segurança».

A Refer prevê uma intervenção no túnel do Rossio para «a consolidação, a estabilização e o reforço da estrutura e geometria da galeria; a regularização do sistema de drenagem; a substituição dos vários tipos de via existente por via embebida em laje; a substituição do sistema de suspensão da catenária; e a segurança integrada».

As falhas apontadas são várias. No caso do túnel do Rossio não se vêem quaisquer bocas de incêndio, nas duas extremidades, quer do lado de Campolide, quer na estação do Rossio. Os extintores «existem nas próprias composições», responde a Refer.

Como explicou ao PortugalDiário Fernando Curto, presidente da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais (ANBP) faltam ainda colunas secas e sinalização dos caminhos de evacuação. No entanto, a Refer dispõe de um comboio-socorro, estacionado em Campolide (para além de outros espalhados pelo país), para circular nos carris para que os bombeiros possam intervir em caso de emergência. Uma situação desconhecida pela ANBP: num primeiro contacto, Fernando Curto disse não ter conhecimento de «um pronto-socorro que circulasse em carril».

O Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa também tem reparos a fazer. Mas Cardoso Alves, comandante da corporação, contactado pelo PortugalDiário, rejeitou dizer quais: «É uma coisa interna», de que já deram conta à Refer e à CP.

A Refer esclareceu que o plano de emergência é «um documento reservado» às entidades competentes. Mas sublinha «todas as hipóteses de ocorrências estão contempladas nesses planos».

Como no caso das estações do Metropolitano de Lisboa, denunciado há semanas pela Deco - Associação de Defesa do Consumidor, Fernando Curto fala também no desconhecimento dos espaços físicos em que poderá ser necessário actuar. Por isso, este bombeiro defende a realização de «simulacros», regulares e com pessoas. «As administrações [das empresas] “fogem” dos simulacros com pessoas, e preferem fazê-los às três da manhã, sem ninguém. Mas para nós é importante testar as reacções das pessoas, para percebermos como actuar nesses casos».

A preocupação da associação com a segurança dos túneis não é de agora. Há vários anos, críticas duras à insegurança de muitos túneis viários da Madeira motivaram a ira do líder do governo regional, Alberto João Jardim. O presidente da ANBP reconhece que, da parte dos bombeiros, «há algum fundamentalismo». Mas «quando se trata de salvar pessoas temos de ser fundamentalistas». E os “fundamentalismos” dos bombeiros profissionais estendem-se a muitas outras áreas.

«Bombeiros só são chamados quando há fogo»

«Os bombeiros só são chamados quando há fogo.» O lamento é de Fernando Curto, presidente da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais (ANBP). Confrontado pelo PortugalDiário com muitas situações de eventual perigo, o dirigente associativo pede compreensão para os alertas de quem está no terreno: «Os bombeiros anunciam estas coisas pela positiva, numa perspectiva de melhorar» as falhas detectadas.

E o mapa dos perigos são muitos. A 12 de Março [de 2002], a Deco - Associação de Defesa do Consumidor pediu o fecho de três estações da rede do metropolitano em Lisboa: Baixa-Chiado, Marquês de Pombal e Alameda chumbaram na apreciação da associação. «Os passageiros do metro correm sérios riscos de vida» naquelas estações, disseram os responsáveis da Deco.

Na altura, Fernando Curto – em declarações ao Público – considerou que «o encerramento de três estações é uma posição demasiado radical, pois, nesse caso, ter-se-ia que fechar também muitos parques de estacionamento, centros comerciais e até hotéis». Ao PortugalDiário lembrou que a Deco nem referiu uma estação «tão ou mais perigosa que aquelas três – a do Parque», pela sua profundidade e por ter uma única saída para o exterior.

Outros exemplos foram ainda apontados por Fernando Curto: os lares de idosos (com vários acidentes mortais nos últimos anos), mas também as escolas. «Agora, se alguém assalta uma escola colocam-se grades, esquecendo-se de que essas grades podem ser um obstáculo no caso de incêndio.»

O que pedem então os bombeiros? A possibilidade de acompanhar e fiscalizar todos estes casos. «Não querendo ser polícias», o presidente da ANBP invoca os exemplos de outros países, em que os bombeiros podem mandar fechar locais públicos, como empresas, discotecas ou centros comerciais, por falta de segurança.


[* - nota: ao fim-de-semana, o Lx Repórter recupera antigas reportagens, que de algum modo permanecem actuais]

19.1.07

Reconhecer direitos humanos de imigrantes irregulares

A Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) lançou esta semana uma campanha “pelo reconhecimento dos Direitos Humanos dos Imigrantes Irregulares”, em associação com outras sete organizações eclesiais e não eclesiais que desenvolvem um trabalho neste campo.

Para este organismo laical e os seus parceiros, pretende-se que Portugal adopte a Resolução 1755, sobre o Direitos Humanos dos Migrantes Irregulares, da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, aprovada a 27 de Junho de 2006, onde se reconhece “que não existe um único instrumento internacional que se ocupe especificamente da protecção dos imigrantes irregulares e que são incertos os direitos mínimos que lhes são reconhecidos”.

Por agora, a CNJP tem em curso um inquérito para “conhecer e dar a conhecer a posição do Governo, partidos políticos com representação na Assembleia da República, confederações patronais e sindicais, em relação ao conteúdo dos Instrumentos Internacionais neste campo”.

Além do inquério, esta campanha pretende “interpelar o senhor provedor da Justiça com vista a que seja assegurado o reconhecimento dos direitos humanos dos imigrantes irregulares, em Portugal”.

A nível internacional, o texto hoje divulgado aos órgãos de comunicação social faz eco da necessidade do Executivo português “[sensibilizar] governos dos outros países para que adoptem igualmente a Resolução” e “[apela] para que seja ratificada, juntamente com os restantes parceiros comunitários, a Convenção das Nações Unidas sobre a Protecção dos Direitos de todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das Suas Famílias”.

A esta acção da CNJP associaram-se a Secção Portuguesa da Amnistia Internacional, a Cáritas, o Centro Padre Alves Correia, a Comissão Justiça e Paz da Conferência dos Institutos Religiosos, a Fundação Evangelização e Culturas, a associação Solidariedade Imigrante e a Obra Católica Portuguesa de Migrações.

O texto completo da iniciativa pode ser lido no site da Comissão.

17.1.07

Enganos na caixa de correio electrónico

Vários meses depois da Caixa Geral de Depósitos e do Millenium BCP terem dado conta de falsos e-mails que estariam a ser recebidos por clientes seus, os "piratas cibernéticos" voltam a tentar a sua sorte, alargando os alvos bancários. Neste momento, circula um e-mail pedindo ao «Estimado(a) Cliente» que «verifique e actualize os seus dados» da Caixa, Millenium, Banif e Banco Popular. Mas a mensagem, encimada pelos logótipos dos quatro serviços bancários, é recebida por pessoas que nem sequer conta têm nestas quatro entidades.

O texto original fornece quatro "links", um por cada banco, para os supostos clientes actualizarem os dados, podendo incorrer assim na quebra de segurança dos dados reais das suas contas bancárias.

Em mau português, os autores (que escrevem a partir de um endereço fictício, mas escolhido para confundir - seguronline@bancopolisjudiciar.pt) dizem que escrevem «com o intuito de melhor o servir». A seguir esclarecem ao que vêm: «o [sic] Caixa Geral de Depositos [sic], Millenium Bcp [este banco usa na sua correspondência esta sigla toda em minúsculas], Banif e Banco Popular vem transmitir-lhe que está a proceder á [sic] verificação e actualização dos dados do cliente. Com vista a este fim, somos a pedir-lhe que verifique e actualize os seus dados. Para sua maior comodidade poderá fazê-lo através do endereço abaixo mencionado». Seguem-se as supostas moradas dos sites bancários, mas que facilmente são desmascaradas, quando se coloca o cursor em cima de cada endereço e aí se lê outro site: segurontheinternet.com.

Mesmo as ameaças são falsas: «Sendo que não o faça poderá ver o seu acesso restringido. O correcto preenchimento desta informação é fundamental para que as suas operações se façam sem prejuízo, para si.»

Por causa destes e-mails, a Microsoft mantém na sua página sobre segurança uma mensagem sobre o Millenium BCP, datada de Junho de 2004. Aí se conta que «actuando preventivamente o Millennium bcp decidiu, a bem da segurança dos clientes, [deixar] de incluir acessos directos ao site www.millenniumbcp.pt, vulgarmente designados de atalhos ou links». E alertam «ainda que não deve revelar, nunca, os seus elementos identificativos ou códigos de acesso pessoais, mesmo que o interlocutor se identifique como colaborador do Millennium bcp».

15.1.07

A Gulbenkian sem multidões


[filas para a exposição de Amadeo, que encerrou ontem as portas, composição fotográfica MM]

Depois do êxito absoluto com a exposição de Amadeo de Souza Cardoso, que atingiu quase 100 mil visitantes, a Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, mantém várias exposições nos seus espaços (Museu, Centro de Arte Moderna José Azeredo Perdigão e jardins), que merecem uma visita sem multidões e sem pressas. Desde o passado dia 11, até 25 de Fevereiro, «Vanitas», na Sala de Exposições Temporárias do CAMJAP, um tríptico de 2006, encomendado pela Gulbenkian, nos 50 anos da instituição, a Paula Rego. No sábado, dia 3, há uma visita guiada por Ana João Romana.

No hall de entrada do mesmo CAM, está instalada uma obra de Matej Krén, eslovaco que apresenta «Book Cell». Livros empilhados recriam uma vertiginosa estrutura arquitectónica, que pode ser visitada e experimentada. O autor convida-o a entrar na estrutura e a percorrê-la, numa surpresa inesperada. Até 29 de Abril.




















[«Book Cell», Matej Krén, no hall do CAM, fotos MM]

14.1.07

Reportagens do baú: Crónica de uma missa profana

[publicada originalmente a 7 de Julho de 2003 no PortugalDiário]

REPORTAGEM: A liturgia de um congresso social-democrata, que se confunde com Portugal. Haja fé no Partido. O jornalista esperou pela madrugada para ouvir os delegados que as televisões não mostram


«Visto lá de baixo isto parece bem mais fácil, mas daqui vê-se um Portugal inteiro.» Afinal, "isto" «não é só um congresso do PSD, é um congresso de Portugal, de portugueses para portugueses». Ninguém duvida da afirmação do jovem engravatado que fala ao "povo laranja" - e as palmas confirmam.

É, pois, uma liturgia popular a que se assiste. A segunda noite de trabalhos do conclave máximo do Partido Social-Democrata, de volta ao poder, sublinha os rituais de quem gosta do poder. E de se confundir com o poder. Que é como quem diz, de ser Portugal: «Só com o Governo social-democrata», diz-se para justificar pedidos, exigências, conquistas, sucessos, para sublinhar o óbvio: é «um congresso de Portugal».

O povo fala. «O PS é mau, primário, totalitário, incompetente», «sufoca a nossa vida», exclama um delegado de Matosinhos. Que tem uma curiosa tese sobre a democracia, para quem vive sufocado no totalitarismo: «O aperfeiçoamento da democracia só pode servir bem às ideologias que são capazes.»

O povo aplaude. «Num acto humilde e público quero agradecer a vitória ao fim de 27 anos de socialismo em Caminha», terra onde «o senhor primeiro-ministro [então Durão Barroso] e sua excelentíssima família passa férias», agradece o porta-voz dos «pescadores e agricultores humildes».

O povo lembra. «Encontrei o "Zé" do Marcelo Rebelo de Sousa, do Pedro Santana Lopes e do Durão Barroso, o "Zé" esquecido» em tempos de poder, que pediu a um delegado, Fernando Costa, para ser lembrado. «Ó Costa, dá lá uns recados, diz que este congresso está muito pacífico, que as bases é que devem falar.»

O povo engole. A custo, aplaude-se o líder popular Paulo Portas, outras vezes vaiado. Mas há quem ainda tenha dificuldades em beber do mesmo corpo e sangue: «Temos uma maioria absoluta, infelizmente com Paulo Portas.» E daí a conclusão do mesmo delegado: «Com Deus me deito, com o Diabo me levanto.»

Para não desdizer Fernando Seara, que ao PortugalDiário falava no congresso do PSD como «uma missa», muitos leram na Bíblia os sinais do futuro. «Expulse os vendilhões do templo», exortou um fiel seguidor ao seu Cristo-Durão (o mesmo Cristo invocado por Marcelo, no congresso da Feira).

Mas a missa não é sagrada. Todos falam, todos riem, mil toques de telemóvel florescem, e nem a advertência professoral de Manuela Teixeira, dirigente da Federação Nacional de Educação, convenceu os delegados: «Façam menos ruído, por favor, não gosto que outros falem quando eu falo.» As rezas em surdina continuaram.

E se Cristo não desceu à Terra, o congresso teve no palco um orador nato: Pedro Santana Lopes. E uma sala a meio gás, transfigurou-se. Cheia, silenciosa, embevecida. «Sou um homem de fé», proclamou o profeta de Lisboa. Que abençoou a cerimónia: «Assim Deus nos ajude.»

O povo debandou - para casa, para o bar, para a noite. Já ninguém ouviu as dezenas de oradores ainda inscritos. Cá fora, anuncia-se uma peça de teatro. «Últimas representações.»

11.1.07

Pulseira electrónica "vigia" 500 arguidos em simultâneo

PRIMEIRA MÃO: Medida é considerada um sucesso. Apenas nove por cento dos casos foram revogados por incumprimento. Em cinco anos, quase 1700 arguidos foram obrigados a permanecerem em casa com vigilância electrónica.


Mais de 500 arguidos têm estado em simultâneo sob vigilância electrónica, número que estabilizou nos dois semestres de 2006, depois do alargamento da medida a todo o país, revelam os dados acumulados de Janeiro de 2002 até Dezembro último, agora compilados pelo Instituto de Reinserção Social (IRS) do Ministério da Justiça, a que o LxRepórter teve acesso. A aplicação desta medida levou à diminuição, ainda que ligeira, da prisão preventiva (de 3122 casos, em 2002, para 2995, no final de 2006).

Na maior parte das medidas aplicadas (68 por cento), a obrigação de permanência na habitação (OPH) fiscalizada por vigilância electrónica (VE) substituiu a prisão preventiva (representa cerca de 17 por cento do número de presos preventivos), constituindo um “alternativa à medida de coacção mais gravosa”, como se lê no relatório “Cinco anos de vigilância electrónica – indicadores avaliativos: dados acumulados Jan 2002-Dez 2006”. No entanto, segundo este documento, “existe um número não desprezível de casos em que a VE constitui um reforço do controlo e fiscalização da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação”.

Nada desprezível é também a taxa de revogações por incumprimento da medida, que atesta o seu sucesso, garante o relatório do IRS. A taxa situa-se nos nove por cento, “índice que se situa abaixo dos padrões de referência europeus”, e estabilizou nos últimos dois anos neste patamar. No entanto, o tempo de duração da VE é longo, entre os quatro a oito meses (mais de 350 casos), atingindo mesmo períodos de mais de 12 meses (quase 250 casos), o que confirma a lentidão da “resolução da tramitação processual antes da decisão final”.

Na maioria dos casos em que os arguidos ficaram sujeitos a VE, o tipo de desfecho foi a condenação a “pena alternativa” (35 por cento), o “agravamento ou desagravamento” da medida (30 por cento) e a condenação a “pena de prisão” (16 por cento). Absolvidos foram seis por cento, para além dos casos já citados de “revogação por incumprimento” ou de outros motivos não especificados (quatro por cento).

Norte com mais vigilância electrónica

No decorrer do ano de 2006, os tribunais solicitaram informação prévia de 1038 arguidos sobre a possibilidade de lhes aplicar a medida, tendo sido a VE aplicada a 617. Desde o arranque da medida em 2002, o número de pedidos de informação está próximo dos três mil (2924). A vigilância electrónica foi aplicada em 1649 casos, uma taxa na ordem dos 56 por cento, como indica o estudo, o que indicia que a “informação prévia obrigatória prevista na lei contribui para seleccionar os arguidos com aptidão” para a VE. De facto, a lei prevê que “as equipas do IRS [elaborem], a pedido dos tribunais, uma informação prévia à decisão judicial sobre as condições pessoais do arguido”, em que se esclarece “as condições sociais e familiares do arguido e da sua compatibilidade com as exigências da VE”.

É a Norte que mais tem sido aplicada a VE. Dos 260 pedidos de informação, foram aplicadas 210 pulseiras electrónicas em arguidos. A região de Lisboa e Vale do Tejo (dados que incluem também a Madeira) foi, no entanto, a que mais pedidos fez, 389, com uma menor percentagem de medidas aplicadas (169 casos, o que significa 43,4 por cento do total de pedidos). O valor só é mais baixo nos Açores: 41,3 por cento dos casos (19 aplicações para 46 pedidos). O Centro e Sul têm percentagens mais elevadas entre os pedidos e as medidas aplicadas (56 e 72 por cento, respectivamente). No Norte, este valor é de 80 por cento.

A execução da OPH estabilizou neste momento em cerca de 500 arguidos: 511, no primeiro semestre de 2006, e 507, no segundo semestre. Muito longe dos 21 arguidos que ensaiaram a VE no arranque do projecto, no primeiro semestre de 2002.

Em cinco anos de uso de pulseiras electrónicas, a esmagadora maioria dos que as usaram foram homens (91 por cento), de acordo com as estatísticas judiciais, na faixa etária dos 21 aos 30 anos (37 por cento). O tipo de crime mais comum destes arguidos foi o crime contra património (quase 800 casos), seguido do tráfico de estupefacientes (cerca de 500 casos) e crime contra pessoas (acima dos 200).

Dos arguidos, 68 por cento estão obrigados a ficar confinados à sua habitação, enquanto que 32 por cento têm autorização para ausências. Destas ausências, 43 por cento prende-se com trabalho, 25 por cento para tratamento de dependências e 18 por cento para estudo.

De acordo com o próprio IRS, “a associação da VE à medida de coacção de OPH visa essencialmente promover a diminuição das elevadas taxas de prisão preventiva” e “reforçar a aplicação de medida de coacção não detentiva, menos gravosa que a prisão preventiva”.


[foto IRS]

10.1.07

Igreja multiplica iniciativas sobre aborto

Alguns sectores católicos vão multiplicar iniciativas sobre o referendo ao aborto, nas próximas semanas em Lisboa. Bispos e leigos dizem querer "esclarecer consciências", na expressão que o porta-voz do Episcopado português, Carlos Azevedo, tem usado.

Dia 18 de Janeiro, quinta-feira, pelas 21h15, o bispo auxiliar de Lisboa, D. Manuel Clemente, aproveitará a entrega de um prémio atribuído pela Associação de Antigos Alunos do Colégio de S. João de Brito para reflectir a propósito do "referendo que se aproxima e da escolha com que os portugueses serão confrontados". O tema é elucidativo: «A Igreja e a Vida».

No mesmo dia, às 21h30, no âmbito dos Encontros de Santa Isabel, promovidos por esta paróquia de Lisboa, discute-se a "despenalização, legalização, liberalização: o debate sobre o aborto". Para lançar pistas para esta reflexão, a organização convidou Pedro Vaz Patto, juiz e membro do Departamento da Pastoral da Família do Patriarcado de Lisboa e da Comissão Nacional Justiça e Paz, e Ana Raposo, médica no Centro de Saúde de Camarate.

Mas estes Encontros - que decorrem a partir desta quinta-feira, nas próximas quatro semanas, sob o lema "Amar Jesus na cidade de hoje" - têm outros debates que poderão tocar a questão do aborto e do referendo próximo. "A vida como um dom: bioética e teologia" marca o seu arranque, na noite de amanhã, sempre às 21h30, animado com a intervenção de Vítor Coutinho, sacerdote e professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica do Porto, numa iniciativa conjunta com o sector de Lisboa das Equipas de Jovens de Nossa Senhora (EJNS).

Também a fechar estes encontros, a 1 de Fevereiro, o cardeal-patriarca apresenta a temática do programa pastoral da diocese de Lisboa, “fazer da evangelização a expressão e o anúncio da caridade”, debate também promovido em conjunto com as EJNS. D. José Policarpo que anuncia quatro catequeses sobre o aborto no jornal diocesano, "Voz da Verdade", a publicar nas próximas semanas, não deixará certamente de se referir ao tema nesta reunião.

Num quase intervalo a estas abordagens, os Encontros de Santa Isabel promovem ainda uma "reflexão sobre a erradicação da pobreza na Cidade e no Mundo" (no dia 25), com as intervenções de Manuela Silva, economista e presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, e Alfredo Bruto da Costa, presidente do Conselho Económico e Social.


[nota editorial: o primeiro título não era correcto. Dizia que a «Igreja multiplica iniciativas a favor do "não" ao aborto», o que pode acontecer com a conferência de D. Manuel Clemente, por ser conhecida a posição do Episcopado português nesta matéria, mas não será correcto no ponto de partida dos Encontros de Santa Isabel. Aqui fica a correcção e o reparo, devidos pelo estatuto que queremos manter para este espaço.]

[disclaimer]

O autor deste blogue desconhecia até hoje a existência de um outro blogue com um nome idêntico - Repórter LX (criado em Setembro, na comunidade de blogues do jornal Expresso) - da autoria de Bernardo Mendonça, jornalista, que se apresenta como «o blogue em que a realidade ultrapassa a ficção». Os objectivos e propósitos, apesar da semelhança de nome, são portanto diferentes.

8.1.07

Compreender as dinâmicas religiosas do mundo

Um curso de especialização em História das Religiões quer dotar de “uma mais correcta compreensão das dinâmicas religiosas do mundo” os seus participantes, numa época em que o “‘retorno do sagrado’ é mais que legítimo ou natural”.

Promovido pela Área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, este curso pretende responder à urgência que estes dias trouxeram: “Muitas das estacas da nossa normalidade foram sacudidas e arrancadas por fenómenos directa ou indirectamente relacionáveis com a Religião, mais propriamente, com o chamado ‘fundamentalismo religioso’”, lê-se na apresentação do curso.O curso funcionará em regime de Curso Livre, sem nenhum pré-requisito de admissão, e pretende interessar todos os que estão “verdadeiramente interessados com o desenrolar dos problemas religiosos da História da Humanidade”.

Coordenado por Paulo Mendes Pinto, professor nas licenciaturas em História e em Ciência das Religiões da Universidade Lusófona, este curso de especialização terá início a 5 de Fevereiro, com funcionamento às segundas e terças-feiras, das 19h às 22h. Os sete módulos lectivos levarão os interessados pela “Religião do Próximo Oriente Antigo”, “Religião do Vale do Indo”, “Caminhos do Monoteísmo” (em duas partes), “Herança Clássica”, “Os Confrontos Santos” e “Religião e Modernidade”.

6.1.07

Reportagens do baú: Campeão ao fim de nove anos: uma entrevista com Maria Rueff, ou melhor Zé Manel, o taxista benfiquista

[Entrevista originalmente publicada em 2003, no Culto, antiga página de Cultura do portal IOL e do jornal PortugalDiário]


O título que foge há muito aos benfiquistas é compensado pela vitória noutro campo - o da música. Zé Manel, taxista de profissão, benfiquista acima de tudo, chegou, cantou e derrotou as claques que sabiam porque é que não ficavam em casa e os "filhos da Nação" vestidos de dragão. Só dois anos depois da entrevista, Trapattoni deu a alegria que faltava a Zé Manel




O taxista Zé Manel conquistou o campeonato. Depois das claques que sabiam porque é que não ficavam em casa e dos "filhos da Nação" vestidos de dragão, Zé Manel chegou, cantou e venceu as faixas de campeão que escapam - no outro campo - ao "seu" Benfica. Uma personagem a que Maria Rueff já dava vida em directo no Herman SIC e que se "clonou" numa página de humor de A Bola.

Agora, o taxista salta da bancada para o CD - um disco até para "não-benfiquistas" - e não teme o desafio: finta as letras da dupla criativa das Produções Fictícias (os "fedorentos" Ricardo Araújo Pereira e Miguel Góis) e passa rasteiras a convidados "crème de la crème", como Sérgio Godinho, que é «um puto cheio de talento», e José Estebes, o "alter-ego" portista de Herman José.

Sem jogar à defesa, Maria Rueff explicou a táctica desta personagem ao Culto!, com a sua "rénite" a trair-lhe, por vezes, a resposta e o riso ou as fífias num campo que ainda não domina tão bem como a sua personagem, quando fala em «doze jogadores» ou «50 minutos» de jogo. Mas a actriz não fugiu às perguntas do que se joga noutros palcos: o humor em Portugal e os dias de sobressalto do seu companheiro de rábulas, Herman José.

Este disco é a entrega das faixas de campeão do José Estebes ao Zé Manel?
[risos] Não sei. Não. Acho que a personagem do Herman é tão extraordinária e já vive com todos nós há 20 anos. O Zé Manel só vive desde 1998, ainda lhe falta palmilhar muito para chegar ao nível do Estebes.

Mas do "Tal Canal" aos dias de hoje, se calhar a idade já pesa ao Estebes. Zé Manel terá outro vigor.
Acho que não. Na "picardia" dos dois [«E vai acima (picardia com José Estebes)»], acho que se nota que são dois fervorosos adeptos... e luminosos [risos]. Continuo a achar que o Estebes é uma grande construção. Caramba! Eu tinha seis anos e já assistia ao José Estebes. Se calhar, o Zé Manel nasce porque o Estebes já existia...

... e o Porto vai dando motivos ao José Estebes para existir...
Exacto!

Como aparece, então, o Zé Manel a gravar o disco?
Esta ideia surge do Tozé Brito, [administrador] da Universal [a editora do disco], que propôs - a mim e às Produções Fictícias - gravar um disco para o Benfica. Não aquele disco tradicional de claques, mas que tivesse a componente de humor das crónicas do jornal A Bola, que as Produções escrevem, que tivesse o "boneco" em si e música de grandes compositores portugueses. Este foi o clique que me fez aderir ao projecto!
Recusou-se a ideia de que, como é comédia, qualquer sintetizador serve. E ter craques - como o Sérgio Godinho, Jorge Palma, os Xutos, o Herman, o [Fernando] Tordo, o Paulo de Carvalho -, a comporem para humor foi uma coisa extraordinária. Isso é fundamental. Não é por acaso que ainda hoje trauteamos o genérico dos "Marretas".

Colocou uma grande exigência na gravação, mas há também uma grande espontaneidade.
Essa foi a minha grande preocupação. Podia ter-me enfiado num estúdio e ler simplesmente as crónicas. Mas, como não tinha imagem, apenas voz, tive de me concentrar, para que as pessoas ao ouvirem o disco me "vissem". Por isso, trabalhei o disco como se fosse um espectáculo, da mesma maneira que faço as rábulas em directo. Tinha de sair quase à primeira, para ter essa tal espontaneidade, para não soar a artificial - "lá está ela a ler e ainda por cima não percebe nada de futebol!"
Quis também do ponto de vista técnico musical ser completamente fiel à personagem. Que fosse de facto o Zé Manel a cantar, com a sua renite, com o seu problema [imita a voz da personagem]. A única coisa que "negociei" com o Zé Manel foi: "Tens de ser afinado!"

E como foi dar voz a esses nomes sonantes - e inesperados, como Sérgio Godinho?
Desde miúda que sei todas as músicas de cor de Sérgio Godinho. Sou mesmo como aquelas fãs dos Beatles: histéricas! Estar ao pé do Sérgio a cantar foi uma emoção enorme! Se bem que também sou fã da música que o Sérgio escreve - que não é das mais conhecidas - para teatro, programas infantis, cinema... Foi quase um dueto representado [«Picardia com Lagarto»] porque o Sérgio também tem experiência por esse lado.

Nota-se uma experiência anterior a nível musical.
Na adolescência cantei num grupo de música tradicional portuguesa, o Cramol, que gravou com o Zeca Afonso. Desde miúda que canto e já no programa do Marco Paulo que tinha feito umas rábulas com uma componente musical. Já tinha algumas referências: tive aulas de voz no conservatório, mas não sei ler uma pauta!
Para um actor, a própria interpretação muda nestes registos. Não sei se foi por ouvir tantas vezes as construções estranhas do Sérgio Godinho... Mas na marcha de Lisboa, no fado, no rap, tentei sempre que fosse o Zé Manel a entrar nesse ambiente.

Sem saber ler a pauta, até que ponto seguiu uma "pauta". O texto estava escrito, as músicas também. Há ali algo mais?
Os americanos comparam muitas vezes os humoristas ao músico de jazz. Este tem uma pauta, mas depois, em encontros ao vivo, 50 por cento do que se ouve é improviso, que obedece à melodia que está na pauta. O humorista ao representar uma coisa que recebeu "fixa", também a leva a outros "50 por cento". Surgiram-me tiques e coisas a meio daqueles textos rígidos. As próprias letras foram adaptadas às melodias.

E como foi nos monólogos [crónicas lidas, sem música]? Em disco podiam resultar menos bem.
O trabalho foi muito parecido com o que faço nas rábulas na televisão. Uma graça escrita é uma coisa, uma graça dita é outra muito diferente. Por exemplo, há uma parte onde falo do padre Vítor Melícias [no «Monólogo Lagartos», sobre o Sporting]. Se eu ler que na Bíblia vem que "Deus é encarnado", a gente ri-se. Dito pode magoar: "Caramba! Está a brincar com a Igreja!". Aqui é dar vida à própria personagem. O Zé Manel é atrevidote, mas é simpático, é reverente.

Até que ponto Zé Manel pode existir para lá do disco e da personagem do programa? Não haverá uma tentação em tornar a personagem numa mascote do Benfica?
Porque não? O Hergé, autor do Tintin, dizia que sentia muito orgulho em o Tintin ser muito mais famoso que ele. Eu não tenho ciúmes nenhuns do Zé Manel! Antes pelo contrário, só tenho orgulho. Nós não interessamos nada, o que interessa é a personagem e o "boneco", e fico muito feliz que ele exista!

Ainda não lhe acontece como com os políticos que são chamados pelos nomes das personagens do "Contra-informação"?
[risos] 50 por cento tratam-me por Zé Manel. Aliás, os taxistas são generosíssimos e perguntam-me: "Ó colega, não quer vir à frente?". Devo ser a única lisboeta que não é enganada nos percursos [risos].

A Maria diz que não percebe nada de futebol...
... e não!

... mas para construir uma personagem como o Zé Manel é preciso ter alguma bagagem do mundo da bola.
Conto com dois benfiquistas ferrenhos, o Ricardo [Araújo Pereira] e o Miguel Góis, os autores do Zé Manel. E que têm essa preocupação de falar com vocabulário da bola. Eu própria faço como quem estuda uma língua estrangeira. Não percebo nada de futebol, mas tive de aprender os verbos, os doze [sic] jogadores, os suplentes que ficam no banco, o árbitro que é não sei quê, os 50 minutos [sic]...
E há a observação dos adeptos. O amor do Zé Manel é pelo Benfica, mas este fervor, esta paixão, este amor à camisola, pode ser pelo Benfica, pelo Manchester United! É comum, é universal. Como a paixão na música. Este fervor é comparável a outras paixões. Foi isso que dei ao Zé Manel.

Passou a estar mais atenta ao futebol.
E passei a ir ao estádio da Luz! A primeira vez que fui ao estádio, ao finito estádio da Luz [risos], com o meu marido - também um ferrenho benfiquista -, lembro-me de ele ter passado o tempo todo a olhar para o jogo e eu para as pessoas! E vão-se apanhando expressões extraordinárias.
Há outra coisa genial: achamos sempre que é o futebol é um mundo de homens, mas há mulheres ainda mais desbocadas e frenéticas! Com bocas mais violentas, de fazer corar qualquer carroceiro. É um mundo muito especial. É vulgar que, quando há um golo, o doutor ou o senhor todo bem posto se abrace ao cigano ou ao arrumador mais "chungoso". Há uma irmandade que só é possível no futebol.


«O humor é sempre uma coisa por camadas. Feliz o que come o bolo todo»

A Maria tem um percurso muito multifacetado. Como é que estas coisas se encaixam, como é que vão funcionando?
Sou acima de tudo uma actriz, que se tem fixado mais no registo da comédia e do humor. No início podia ter optado por fazer várias coisas ao mesmo tempo, mas achei que faz sentido a especialização. Se eu toco bem um instrumento porque é que hei-de tocar menos bem uma data deles ao mesmo tempo? Sinto que a minha praia, como dizem os brasileiros, é o humor e a comédia. Gosto muito!

Fala-se agora de uma revitalização do humor em Portugal - das Produções Fictícias a alguma "stand-up comedy" que aparece nas televisões. De facto, há essa revitalização do humor, ou ainda são pequenas ilhas num oceano imenso?
Acho que ainda são pequenas ilhas. A nuvem dos "reality-shows" ainda não passou de todo. Esta tentativa de "stand-up" em televisão não é bem o que é a "stand-up comedy" em teatro, que é uma coisa muito mais subtil, muito mais de "non-sense". Basta lembrarmo-nos, às vezes, dos discursos iniciais do Seinfeld - coisas não óbvias, que é contar uma história com graça. O "Levanta-te e ri" [programa da SIC], salvo algumas excepções muitíssimo boas, é uma colagem de anedotas. O que também já é bom - fico felicíssima pelo seu sucesso e porque acho bom que as pessoas estejam outra vez abertas a rir.
Acho extraordinário o sucesso das "Manobras de diversão" [no palco do Teatro São Luís, em Lisboa], onde está o Manuel Marques, que surgiu no "Programa da Maria". E há público para essas pessoas, eles estão sempre esgotados. Como fico feliz com o José Pedro Gomes e o António Feio, na "Conversa da treta". Mas são pequenas ilhas.

Ainda permanece mais o registo dos "Malucos do Riso", da piada mais fácil, do que um registo como o "Casino Royal" ou o "Humor de Perdição".
Absolutamente. O meu próprio programa foi suspenso na SIC ["Programa da Maria", está a ser exibido na íntegra na SIC Radical]. Nós estamos a viver tempos tão complicados, vivemos tempos de medo, de desemprego... O humor mais complicado obriga a pensar. E é muito mais fácil servir um rápido bife com batatas fritas, "riam-se lá desta anedota", e vai tudo para casa. O resto implica mais trabalho, para quem faz e para quem recebe.
Para ver o "Casino Royal" era preciso ter visto as notícias, tê-las percebido, para depois ver onde estava a graça. Uma anedota óbvia do alentejano ou de tomates - é uma coisa descartável, ri-se e pronto. Mas já acho bom que se tenha vontade de rir em tempos tão tristes.

Mas os textos das Produções Fictícias também pedem alguma atenção ao que passa.
O Herman dizia há vinte anos que fazer humor é fazer um bolo de bolacha. O humor é sempre uma coisa em que nem toda a gente apanhará o bolo inteiro. Há pessoas que perceberão só a primeira camada, a mais óbvia.
Para lhe dar um exemplo: o Nelo e Idália [personagens de Herman José e Maria Rueff]. Há ainda muita gente que se ri porque acha que é só um casal que se dá mal. Outros percebem que ele é uma "bicha" que usou uma mulher para se casar e critica-se a quantidade de "bichas" casadas - porque a própria sociedade "obriga" e porque as pessoas não têm coragem de assumir a sua homossexualidade. Há outras que se riem da falta de graça da Idália, há outras que se riem só com o boneco do Herman.
O humor é sempre uma coisa por camadas - feliz o que come o bolo todo! Mas para quem só perceber a camada de cima, de manteiga e açúcar, já é saboroso. Às vezes, nós próprios a fazer o bolo não temos uma leitura que outras pessoas têm. Já me aconteceu ficar perfeitamente extasiada com a leitura que professores catedráticos fizeram de rábulas minhas!

Para "apanhar" uma personagem que conhece menos procura estudá-la no meio?
Observo tudo. Os actores são quase todos assim. Há até quem nos acuse de roubarmos a alma às pessoas. É um estudo muito exaustivo. Quando se tem que fazer alguém como a Manuela Moura Guedes, por exemplo, chego a dar em louca. Vejo tantas vezes a mesma cassete que fico semanas inteiras com tiques, vidrada, a papaguear aquilo!
No filme do Luís Filipe Rocha [«A Passagem da Noite»], em que fiz de prostituta, disse ao realizador que aquilo que gostava de dar era as prostitutas que existem mesmo. Basta observá-las no Conde Redondo [em Lisboa]: não têm nada de sensualidade, nem de "puta-cliché" à americana, boazona de mini-saia. São mulheres com celulite, doridas pela vida, que têm aquela profissão para sustentar os filhos, que têm frio à noite, encostadas a uma esquina com um "kispo" e uns decotes mal-amanhados.

Como é que tem sido trabalhar nas últimas semanas com Herman José [com as acusações no processo Casa Pia]?
Tudo igual, tudo igual. Tranquilíssimo. Não mudou nada.

Não há temas-tabu?
Claro que sim. Morreu o pai do Herman, como morreu o meu - nessas semanas, vou estar sempre mais sensível a brincar... Para já, não gosto nada de brincar com a morte! Vou estar mais sensível. Nas minhas rábulas tento fazer sempre um exercício, para mim: eu ria-me ou ficava magoada? O humor não tem como objectivo magoar ninguém. Para mim, não faz sentido fazer humor que não seja catártico, para evoluirmos todos. [risos]

[regresso]

O LxRepórter regressa depois deste fim-de-semana ao seu ritmo habitual: notícias e reportagens de segunda a sexta-feira, e outros textos recuperados do baú do tempo aos sábados e domingos.

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